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31 de jul. de 2007

FRIO DAS CALÇADAS

O inverno é a estação do conforto.
Blusas, luvas, cachecóis...a moda.
Dizem que as pessoas ficam mais bonitas.
E vento frio, as vezes úmido, seco...
Carrega o tilintar dos dentes que batem.
Mas são poucos os que podem ouvir.
E a fome aumenta, conforme diminui a temperatura.
Nas calçadas os esquimós urbanos
Não fazem fotossíntese.
Eles tentam esquecer que são gente.
Oh! Cam, segundo filho de Noé
Tu que reinaste na Babilônia e em Ninive
Conclama a teu pai um novo dilúvio.
Para afogar a dor e o sofrimento
Além de todos os julgamentos Divino.
Porque eles são desprovidos da beleza da moda.
E quem os olham não consegue sentir a harmonia do belo,
A mesma harmonia das vitrines das lojas.
Mas eles esperam, mesmo sem saber,
Que a semente de uma promessa cumprida,
Sem apressar o bem e o mal,
Floresça naturalmente com o calor do sol.
E a noite fria nunca tem fim...

VANDERSON PIRES

24 de jul. de 2007

DESPEDIDA

Estou amarrado enquanto te vejo partir
E você caminha muito lentamente...
Fecho meus olhos, na esperança de não te ver mais
Mesmo assim você caminha lentamente.
Quem segura a tua mão?
Será a certeza de um julgamento?
Se o meu erro foi tão cruel, mate-me!
A superação é uma virtude para poucos.
Mas a transformação e para menos ainda.
Vai! Atravesse logo e desapareça no horizonte.
Já aprendi a viver fora do útero.
Também já senti a dor da morte.
O apego é o desassossego da alma.
Meu ego foi transpassado pelo teu punhal.
Sinto-me julgado pelos romanos.
E a minha coroa de espinhos é o teu adeus...
Ainda posso ver a tua imagem.
Mas já estou desatando as amarras.
Queres que eu te deseja felicidade?
Pois bem, mas primeiro terás que morrer.
Mesmo que isso signifique matar-me.
Porque carrego-te dentro de mim.
Ah! Maldito ego. Tu jogas para todos os lados.
Primeiro você impede o perdão.
Depois assombra o pecado,
E afunda os barcos que navegam em águas calmas.
Agora vejo minhas mãos livres.
Meus pés também estão soltos.
Penso em correr até te alcançar...
Mas, existe como correr da chuva?
Mesmo com a rainha perdida
Eu ainda sou o rei do meu castelo.
E devo proteger meu reino
Escolha o teu caminho e segue-o.
Porque ainda tenho meus peões para atravessar o tabuleiro.
E eu respiro lentamente
Seguindo na direção oposta.
Penso no mundo que é grande
E na vida que é passageira.
Neste momento nasceu uma flor nas minhas costas.
E, apesar da tristeza e do choro...eu sorri.

VANDERSON PIRES

13 de jul. de 2007

UMA CONTESTAÇÃO MITIGADA

Em meados dos anos 50 a crença dos positivistas de que a ciência seria capaz de promover o progresso da humanidade já não convencia muita gente. A crise mundial de 1929 e as duas grandes guerras criaram mazelas profundas e provocaram sérias desconfianças nos valores da chamada civilização cristã ocidental (capitaneada pela pujança econômica norte americana), até então, incólumes de maiores questionamentos pelo senso comum.

A juventude americana do pós guerra, insatisfeita com os rigores da tradição puritana, buscava definir-se em novos padrões de comportamento. Inspirado nessa inquietação incipiente, surge o "rock'n roll". A rápida secularização dos costumes liberalizou as formas de expressão o que contribuiu decisivamente para a eclosão dos movimentos estudantis no final da década de 60.

A divisão do mundo em dois blocos antagônicos depois de 1945, abriu um período conturbado nas relações internacionais. A guerra-fria desencadeou um clima de insegurança e medo entre os povos. Ela expôs as contradições e os sinais de evidente esgotamento do "American way of life". O sentimento de insatisfação ensejou reações de repúdio ao arrivismo vitorioso alardeado pela classe média. Inicialmente comportamentais, porém, o acirramento das tensões acabou por transpô-las para o domínio da política. E o rock tornou-se uma espécie de porta voz dessas mudanças. A jovialidade e a alienação de suas primeiras composições rapidamente transformaram-se no ritmo agressivo de guitarras distorcidas e letras em carregado tom de protesto (a guerra do Vietnã foi um catalisador dessa transformação). Queria-se cuspir na hipócrita indumentária com que se vestia a sociedade ocidental.

A contracultura denunciou a decadência moral da burguesia. Entretanto não conseguiu ir muito além disso. O discurso furtou-se de conteúdo. A contestação asfixiou a si mesma por não se afirmar como uma alternativa concreta, definitiva. Os paladinos do sexo, drogas e "rock'n roll" (ideologicamente identificados pela prédica do faça amor não faça a guerra) quando não consumidos pelo desespero, tornaram-se algozes dos próprios ideais. Acomodaram-se nos dividendos que a cultura "underground" proporcionou. Não resistiram aos deleites do mercado (nem desejavam!): suntuosas ofertas de uma vida de luxúria, sucesso e fortuna.

Dos velhos festivais sobraram apenas os rótulos, uma vez que não há mais o que contestar. O mundo exorcizou seus fantasmas para que pudéssemos entrar, incondicionalmente, na era da unanimidade consumista.

Se é verdade que a contracultura soou muito mais como uma vertente da sociedade de consumo, aquele sopro de rebeldia marcou-nos com uma força criativa paradoxal, presa a um tênue limiar de três acordes que se já acomodou algum talento, hoje não passa de mera banalidade.

O rock é fruto dessa contradição, uma marca registrada do nosso tempo.

CAETANO PROCOPIO (4/7/99)

5 de jul. de 2007

OS MUROS DA VERGONHA

Em 1989 caiu o muro de Berlim.

No “ocidente livre” também era conhecido como “muro da vergonha”.

E de fato, era uma vergonha.

Transformou-se num símbolo do totalitarismo. Escondia a podridão de um regime decadente e carcomido. Não existia socialismo do lado de lá, pois, do contrário, não haveria necessidade do muro.

Mas ele caiu (...)

E do lado de cá, o “mundo livre” também resolveu erguer seus muros da vergonha.

Em Israel, para isolar a faixa de Gaza e a Cisjordânia. E na fronteira dos Estados Unidos com o México pra impedir que “cucarachas” invadam o território norte-americano.

O “mundo livre” nunca passou de um mero “slogan” do mercado.

Só que agora também possui muros para se envergonhar.


CAETANO PROCOPIO