Total de visualizações de página

26 de nov. de 2007

UMA RECUSA AO CONFORMISMO

Caro amigo:

Não me entenda mal. Não vivo sob o signo do pessimismo, nem o tenho como conduta. Quando brinquei sobre o mau humor, quis apenas dizer que esse conceito muito em voga de viver e agir de forma "positiva" não passa de um apelo ao pragmatismo barato. Além disso, é uma maneira egoísta e mesquinha de pensar a realidade, como se apenas nossas pequenas misérias valessem ajuda. O mundo como está não cabe esse otimismo, ou você concebe uma felicidade somente a você e seus pares? Se for assim, desculpe-me meu caro, mas essa conversa não possui significado algum.
Entendo que devemos buscar um sentido para viver, entretanto, achar que a felicidade será encontrada só através do "autoconvencimento" e do "autoconhecimento", sem refletirmos sobre o que está a nossa volta é ilusão.No fim das contas ser otimista ou pessimista é a mesma coisa. Ambos vivem num universo irreal em que o grau de alienação irá determinar uma ou outra situação. Tanto um quanto outro podem mudar de lado a qualquer momento, estão ao sabor das circunstâncias sem, contudo, compreendê-las. A consciência do mundo não cabe eufemismos, vivemos em plena barbárie, porém, acreditamos estar no esplendor da civilização com nossa cultura “high-tec”. O otimismo receituado por esses oportunistas que prometem uma vida equilibrada e sadia é tão descabido como o discurso daqueles ecologistas que defendem a proteção do meio ambiente sem questionar a lógica destruidora da sociedade de consumo (ou que no máximo buscam mecanismos que disciplinem a volúpia consumista). Do que adianta bradar contra a poluição do ar ou das águas ou vociferar contra a destruição das matas e da vida selvagem quando a própria cultura "moderna" além de dizimar os recursos naturais, não sabe o que fazer com o lixo que produz. De certa forma, aceitar uma solução parcial e conciliatória para nossos problemas é dar razão a um individualismo odioso que nos ensina a buscar o sucesso pessoal a todo custo, sem que para isso nos atentemos para os lados e vejamos os miseráveis se amontoarem famintos defronte nossas portas. Portanto, aquilo que lhe falei nada tem a ver com baixo astral ou coisas do tipo, é só uma recusa ao conformismo.
Desculpe-me pela divagação e se roubei seu tempo!

Um abraço,
Do amigo.

CAETANO PROCOPIO

22 de nov. de 2007

MORTE

Existe uma ponte. Ela é o caminho que devemos cruzar. O outro lado da
vida: a morte. A responsável pela criação de Deus e seus semelhantes.
Histórias, desejos de eternidade, espíritos e o medo de morrer...
O apego é a bola de fogo que não queremos nunca largar.
Mas o amor, o verdadeiro amor, existe para livrar-nos do peso da perda, do egoísmo existencialista que carregamos sem parar para questionar.
Eu não deixo de amar alguém porque ela não está perto de mim.
E procuro entender a grande ida sem volta. Quando o corpo é coberto por terra e a vontade de chorar for mais forte, o amor tem que falar ao coração: "entenda a natureza porque você faz parte dela". E o que é natural carrega o bem e o mal no mesmo cerne.
Somos visitantes em uma rápida excursão pelo mundo. Apenas isso.
Sinto saudade dos que foram. Mas eu os amo da mesma forma.
Tento compreender o caminho...
E peço forças para o amor, para que ele alivie as minhas dores e as do mundo.

VÂNDERSON PIRES

20 de nov. de 2007

O DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA

Certa vez, quando ainda cursava a faculdade de Direito na década de 1990, um professor afirmou que não mais havia discriminação contra as mulheres, como ocorrera no passado. A legislação já as equiparavam aos homens.

Se de fato fosse verdade, as mulheres não precisariam da lei para declará-las iguais, nem mesmo de um dia específico pra celebrá-las. A condição de mulher, por si só, seria uma afirmação.

A norma retrata uma realidade contrária. A discriminação existe e a lei não se mostra capaz de dissuadí-la porque ainda faz parte do pensamento comum.

Da mesma forma, se necessária uma data para institucionalizar o dia da consciência negra, ela não existe de fato. Há sim, vários “rascismos” dissimulados numa sociedade extremamente dividida e desigual.

20 de novembro precisa ser muito mais que uma mera data comemorativa no calendário para se transformar numa luta diária contra todas as formas de discriminação.


CAETANO PROCOPIO

14 de nov. de 2007

O ANDARILHO MUITO LOUCO

(por IRAN MARCIUS)

E de repente, como se o mundo todo o chamasse ao mesmo tempo, ele se
levanta, com os olhos esbugalhados, emitindo sons estridentes e
confusos, agitando todos à sua volta, sem descanso, sem clemência. E
sua agitação contagia e alegra a todos.

Ele vê, mais uma vez, que o mundo como é não lhe agrada os olhos... e
nem o paladar. Ele então se envolve na neblina, trazendo à memória
todos os ancestrais, todas as experiências, e dessa maneira o mundo
fica com a forma e com o sabor que ele deseja. E seus sentidos se
aguçam, cada célula de seu corpo é tomada pela calma desesperadora, e
nesse estado, e nunca sem pressa, ele se põe a... ANDAR.

A caminhada pode ser longa, ou curta, independente de onde se quer
chegar. O que importa é o processo, o vento no rosto, o som das vozes,
as formas. O mesmo caminho pode levar a vários lugares, ou ao ponto de
partida. Caminhos diferentes podem levar ao mesmo lugar... ou a lugar
algum... ou ao ponto de partida.

Mas ele tem a selva estampada em seu rosto. Vê cada clareira, cada
rio, cada animal que se movimenta. Ele tem a selva na palma da sua
mão, mas não se importa... porque só olha para as costas dela.

E ele anda, enlouquecido e ao mesmo tempo entorpecido, com passos
firmes de quem tem um objetivo muito claro... mas sem a menor idéia de
como vai chegar lá.

Minha homenagem, ainda que pequena, ao amigo, ao irmão, de hoje e
sempre. É isso aí, indião!!!

4 de nov. de 2007

O LEVIATÃ

Hobbes define a essência humana como sendo uma condição brutal em que os homens, levados por instintos individuais, cultivam a beligerância contra os outros. A defesa de suas paixões mais viscerais é um conflito perene que estabelece uma relação de rivalidade com os demais. Somente a presença onipotente de um poder despóstico que suprima esse estado original seria suficiente para corrigir o caráter hostil desse “homem natural’.

Rousseau atacou duramente a função totalitária do pensamento hobbesiano, definindo uma razão mais generosa ao espírito humano. Mas a vida em comum ressalta algumas diferenças imanentes entre as pessoas, que podem perverter a sua “natureza benigna’. Ao contrário de Hobbes, acreditava no contrato social como forma de legitimar um sistema político baseado na igualdade civil.

Hobbes justificou o absolutismo inglês dos idos de 1600. Rousseau foi um apóstolo dos ideais democráticos que tão marcadamente caracterizaram a concepção do mundo burguês após o século XVIII. A preocupação em definir uma ética condizente com a ação política é um exercício que sempre fascinou a tradição filosófica.

Não há como predefinirmos o homem em categorias estanques (“bom” ou “mau”), pois, ele é um ser em permanente mutação e o sentido dos seus atos depende das escolhas que faz a todo instante. No momento, parece que o contrato social está a beira da falência, moribundo. Impossível suprimirmos nossas diferenças sem que tenhamos que demolir por inteiro as bases em que se assentam a sociedade civil. Mas antes do seu fim, nos deixa um legado sórdido que surge de suas entranhas como um leviatã poderoso e incontrolável. Esse monstro que nos apavora se realimenta da própria fúria, num processo cíclico de recriação. Quanto mais nos barbarizamos mais nos desumanizamos nos transformando em seres individualizados e vazios.

O contrato social degenerou-se num leviatã muito mais tenebroso do que aquele definido por Hobbes, mostrando-se inviável numa realidade em que a igualdade jurídica não passa de retórica. Em um mundo permanentemente desigual, as diferenças tendem alimentar uma resistência ao argumento de que a democracia nos assegura um destino comum. Necessitamos recriar nossa essência através de uma ética universal, solidária. Um caminho em que enfim aceitemos nossa condição de cumplicidade com os outros.

CAETANO PROCOPIO