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13 de fev. de 2013

DEZ DIAS VIVENDO COMO UM MONGE

Tenho uma lista de coisas que devo fazer antes de morrer. Não sei se serei capaz de realizar todas elas, mas de uma coisa tenho certeza: todo ano ela diminui um pouco, ou seja, tento constantemente colocar em prática aquilo que acredito. Essa é a forma que encontrei para dar sentido a algo que não tem sentido algum: a vida. Um dos itens desta lista era viver como um monge em um mosteiro budista. Queria entender como é a vida de um monge, como é viver completamente isolado da sociedade convencional, o que é meditação, como funciona. Essas sempre foram as minhas dúvidas sobre o que é ser um monge. Apesar de ser ateu, sempre procurei ler sobre o budismo e a prática da meditação, pois acredito que nada nesse mundo seja mais poderoso do que o controle da mente. Além dessas dúvidas, tive várias razões para querer realizar esse objetivo; primeiramente, acho a filosofia de Buda algo fascinante. Suas descobertas sobre a mente humana mostram o único caminho real para a liberdade humana: viver o presente. É a busca constante do controle da mente, entre as memórias do passado e as ansiedades do futuro. Outro fato importante sobre o budismo é que ele foi transformado em uma prática religiosa, mas sem nunca ter gerado nenhuma guerra em toda a sua história, o contrário do que fizeram nas outras religiões. Por tudo isso, resolvi começar o ano de 2013 de uma forma diferente: por dez dias, vivi como um “convidado” em um mosteiro busdista, submetendo-me às regras e práticas que envolvem essa filosofia. O monastério está localizado no meio de uma floresta, com um rio que corre pelas montanhas. Um lugar muito bonito, que respira paz e harmonia. O cenário perfeito para buscar o auto-conhecimento. Eram aproximadamente onze horas de meditação diária. Todos os dias iguais. Levantávamos às 4 horas da manhã, praticávamos meditação sentados por uma hora. Tomávamos o café da manha e logo depois meditávamos por meio de uma técnica chamada “walk meditation” (meditação andando), e em seguida voltávamos a meditar sentados por mais uma hora. Por volta das 10:30h era servido um almoço e depois dessa refeição não comíamos mais nada até o dia seguinte. Toda comida consumida no mosteiro vem de doações, já que os monges não possuem qualquer bem material, ou seja, nenhum dinheiro. Eles comem somente o que lhes é ofertado. Logo no primeiro dia, algo me chamou a atenção. Confesso que não suportei o peso das minhas lágrimas. Fiquei muito emocionado quando pela manhã, pessoas de várias nacionalidades, vieram ofertar comida para os que estavam no mosteiro. Tudo isso acontecia no mais profundo silêncio. Ninguém falava com ninguém, apenas gestos de reverência eram expressados. Senti que eles sabiam muito bem de todos os sacrifícios que envolvem aquele lugar. Com certeza esse ato de caridade foi o meu suporte para continuar os meus dez dias de silêncio e meditação. Todos os dias, por volta das 21 horas, após a última sessão da prática de meditação, Ajahn Kusalo (senior monge) falava por aproximadamente 40 minutos sobre o tema escolhido para todo aquele período: morte e renascimento. De acordo com as palavras de Ajah, algo sempre tem que morrer para que o novo possa nascer. Esse é o ciclo natural das coisas. Seus ensinamentos eram simples, mas profundos. Mesmo com todo o meu criticismo, achei lições muito valiosas em suas palavras. A meditação é a busca pela concentração que nos leva a prática do agora. Por meio desse exercicio, desenvolve-se a capacidade de controlar a sua própria mente. Somos escravos de memórias do passado, que geram angústias, depressão, etc. Ao mesmo tempo, somos também viciados em pensar sobre o futuro, que automaticamente gera ansiedade e insegurança. Isso faz da mente um liquidificador que nunca para. Ser capaz de “parar de pensar” é algo tão poderoso que a maior parte das pessoas sequer pensou sobre, mas é algo possível e com benefícios incalculáveis. Quando meditamos, o cérebro produz ondas gamas ligadas à consciência, atenção, aprendizado e memória. Estudos científicos mostram que esse exercício mental tem uma capacidade incrivelmente anormal de proporcionar “felicidade” por meio da anulação da negatividade. Ou seja, você para de gastar energia com coisas do passado. O passado é algo completo, nada pode mudá-lo. E o futuro não existe. O que é real acontece a cada minuto vivido. A prática da meditação me mostrou algo real: experienciar é sempre mais importante do que apenas acreditar. Não acredito em nenhuma teoria sem antes tentar colocá-la em pratica. Essa é uma forma bem simples de acabar com os misticismos, crenças e superstições. Marx exemplificou bem esse pensamento quando afirmou que todo o homem deve “provar” a verdade (praxis). A realidade tem um poder que quando experimentado, liberta o homem sobre a dúvida de qualquer mistério. Isso nos leva a compreensão da vida, de uma forma lógica e racional. Meditar prepara o indivíduo para lidar com qualquer sofrimento, porque desperta a consciência. Esses, sem dúvida, foram os dez dias mais difícies que já vivi em toda a minha vida. Algo que aparementemente se mostra tão simples, ficar sentado em silêncio tentando não pensar em nada, foi um dos meus mais difíceis desafios. E muitas foram as lições que aprendi, mas talvez uma tenha sido a mais importante: não importa o caminho que você escolhe, nada será capaz de salvá-lo da velhice e das doenças. Por isso, não deixe o presente passar despercebido. Viva o presente. Acorde para as expêriencias!

VANDERSON PIRES (www.combatroom.co.nz)