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27 de set. de 2007

CAVALOS

I

Deitada sobre mim, ela escondia sua intenção.
Julgou ser capaz de me aprisionar, com um simples olhar sem nenhuma razão.
E eu, ligeiramente ingênuo, deixei acreditar. Que toda a voz proferida pudesse voltar
ao lugar da partida. Onde a morada nem sempre é vazia. Onde a busca quer me tomar.
Sacudi os flancos. Espirrei os farrapos e corri a olhar pela vastidão de um lindo campo. Busquei meu cavalo e me tornei um herói.
Quando cheguei naquele lugar, era como um deus. Cabelos longos, barbudo montado em um cavalo. Uma visão que os olhos não viam. Eu era a profecia assustadora e galopante.
E também quis provar que em determinado momento da cavalgada, meu cavalo voava. Ele tirava as quatro patas do chão. E ela tentou ver isso. Mas não conseguiu. Porque sua visão era limitada e lenta demais.
E eu disse: "Se um cego pudesse escolher entre a sua visão e a sabedoria dos passos lentos e precisos na escuridão, a resposta seria a cegueira".
Contudo eu não me fiz compreender. E busquei esperar o sol. Parado, respirando tranquilamente, eu fustigava seu ser. Lentamente...
Seu nome era solidão. A viúva que nunca amou.

II

Passado um tempo, logo após o nosso desencontro, eis que o mundo ficou diferente.
Já não era mais possível fingir que estava tudo bem. A depressão, a ansiedade e a angústia eram, agora, aliadas da solidão. As pessoas não deixaram de sorrir por isso. Mas era só um ato de exposição da arcada dentária, assim como os cavalos mostram seus dentes... E eu amava mais os cavalos que aquelas pessoas. E elas também nunca quiseram amar. Só queriam ganhar. Assim como os cavalos nas corridas. E o cheiro do estábulo era melhor que o aroma dos frascos de perfumes famosos. Eu não uso perfume. Como os cavalos.
Eles quiseram ser fortes como os cavalos e correr na mesma velocidade. E criaram os motores com seus cavalos industriais e mecânicos. E transformaram-no em símbolo de poder e status. E todos sonham em ter mais de mil cavalos.
E esse sonho criou guerras, matou pessoas e fez a terra jorrar o sangue negro para os vampiros. E eu apenas queria andar tranquilamente como um cavalo sem senhor, sem dono e sem patrão.
Na época dos cavalos não existia poluição. Não existiam mortes no trânsito e nem o som irritante das buzinas.
Quando os cavalos eram amigos, o homem era natural. Hoje os cavalos perderam a força. E o homem, a naturalidade...

VANDERSON PIRES

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